Página 6 - Caderno Consci

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SALVADOR
QUINTA-FEIRA
20/11/2014
6
ESPECIAL
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R
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CLEIDIANA
RAMOS
repórter
SECRETÁRIO DIZ
QUE EDUCAÇÃO
É ESSENCIAL
Com 10 anos, Luiz Gama vivia
feliz em Salvador até que foi
forçado a embarcar em um
navio. Luiz foi parar em São
Paulo e já não podia brincar
como quisesse, pois virou
escravo e foi vendido pelo
próprio pai. Adulto, ficou famoso
como jornalista e poeta, alémde
usar o conhecimento que tinha
sobre leis para libertar um
monte de gente que havia sido
escravo como ele.
Essa história aconteceu no
século 19, mas ainda hoje as
consequências desse sistema que
permitia escravizar crianças e
todos os seus parentes ainda
atrapalham países da África, o
Brasil e outras nações, como os
EUA, para onde vieram povos
africanos trazidos à força. Na
Bahia, amaioria veiode locais que
hoje são Angola, Benim e Nigéria
(veja o mapa).
Há 14 anos, o Censo, um
levantamento para saber como os
brasileiros têm acesso a educação,
saúdeeoutrosdireitosassegurados
pelas leis, mostrou que 30,57 das
crianças, em cada grupo de mil
nascidas vivas, morriam muito
pequenas. Na Bahia essa taxa era
de 41,81.
Mesmo que os dados não digam
de forma detalhada, Joilson
Rodrigues, coordenador de dis-
seminação de informações da
representação na Bahia do IBGE
(órgão que faz esse tipo de
pesquisa), diz que ao longo do
tempo no Brasil as pessoas negras
estão em desvantagem.
O professor Valdemir Zamparoni,
doutor em história e coordenador
do Programa de Pós-Graduação
em Estudos Étnicos e Africanos
(Pós-Afro) da Ufba, explica que isso
acontece porque o período de
escravidão deixou consequências
muito graves, como o racismo.
MARCAS
Essa palavra é usada nas situações
em que uma pessoa considera a
outra inferior porque ela tem uma
determinada cor de pele ou
textura de cabelo.
No Brasil, como os africanos é
que foram escravizados, os que
têm indicativos físicos desses
povos – pele escura, por exemplo
– continuamsendoosmais pobres
ou que só chegam à escola com
muito esforço.
Isso porque, quando acabou a
escravidão, há 126 anos, ninguém
queria pagar bons salários a quem
até pouco tempo trabalhava de
graça.
As crianças negras adoeciam
mais, pois não tinham como
comer direito nem acesso fácil ao
médico.
Quando sobreviviam, não
podiam estudar porque não
havia escola para todas e
também porque iam trabalhar
para ajudar a família. Isso se
repetiu em várias gerações das
famílias negras.
“Criou-se um círculo vicioso da
pobreza, atingindo sempre a
parcela negra da população
brasileira”, diz o professor
Zamparoni.
E durante a vigência da
escravidão, que durou 300 anos
no Brasil, nem as crianças foram
poupadas.
O professor Walter Fraga,
doutor em história e professor
da Universidade Federal do
Recôncavo da Bahia (UFRB), conta
que em Salvador muitos meninos
foram abandonados ou viviam na
rua para fugir de maus-tratos.
Esses meninos incomodavam
as autoridades. Os capturados
ficavam obrigados a aprender
ofícios com carpinteiros e outros
artesãos ou iam para orfanatos.
Alguns eram levados para a
Marinha, onde reforçavam a
instituiçãoparaumcasodeguerra,
mas não podiam chegar a postos
de comando, como o de capitão.
Aos poucos adesigualdade está
sendo combatida no Brasil. Em
2000, segundo o IBGE, 20,19%
das crianças eram muito
pobres. Na Bahia esse número
era ainda maior: 37,45%.
Em 2010, o número no Brasil
caiu para 11,47%, e na Bahia,
para21,24%. Em2000, 48,59%
das crianças brasileiras de 4 a 5
anos estavam fora da escola.
Dez anos depois esse número
caiu para 19,9%. Na Bahia, o
número caiu, passando de
44,71% para 16%.
Segundo Joilson Rodrigues,
ações como o programa Bolsa
Família, do governo federal,
ajudaram a melhorar a
situação das crianças no país,
pois, para receber esse
benefício, a família tem que
matricular as crianças nas
escolas e vaciná-las, o que
ajuda a prevenir doenças.
Infelizmente, o racismo
ainda não deixou de existir,
mas muita gente ajuda a
combatê-lo.
Como a Lei 10.639/2003 diz
que as escolas devem ensinar
história da África e cultura
afro-brasileira, as crianças
conhecem a história de Zumbi,
Lélia González e outros que
denunciaram o racismo.
São pessoas que têm
trajetórias parecidas com a de
muitas meninas e meninos
brasileiros e quemostramcomo
a educação pode transformar o
que está errado.
SUPERAÇÃO
AS CONSEQUÊNCIAS DESSE SISTEMA
QUE PERMITIA ESCRAVIZAR PESSOAS
AINDA ATRAPALHAM PAÍSES ATINGIDOS
CLAUDIO LUIZ
PEREIRA,
ANTROPÓLOGO
Houve
uma redefinição em
relação à formação das
crianças. Hoje temos leis
como o ECA. Mas o
racismo, sem dúvida,
ainda atrapalha o
acesso a direitos
21,2%
é o número de crianças
consideradas
extremamente pobres
em 2010 na Bahia. Em
2000, elas eram
37,45%
VALDEMIR
ZAMPARONI,
HISTORIADOR
Os países
africanos conquistaram
suas independências no
século XX, mas
enfrentaram guerras
civis e estão
recomeçando do
zero
16%
é o número de crianças
de 4 a 5 anos fora da
escola até 2010 na
Bahia. Em 2000, esse
número era alto:
44,7%
BRASIL TENTA
ATENDER MELHOR
AS SUAS CRIANÇAS
RAIMUNDO
NASCIMENTO,
51 ANOS
Titular da Secretaria
Estadual
de Promoção
da Igualdade Racial
(Sepromi)
A Sepromi tem
programas
para combater
a desigualdade
racial que
atinge crianças?
Não temos ações específicas para
crianças, pois trabalhamos para a
população negra de modo geral.
Mas articulamos várias ações nas
áreas de educação, saúde, trabalho,
renda e acesso à terra. Atendemos
comunidades tradicionais que são
pescadores, marisqueiras,
quilombolas e povo de santo, que
dão atenção e cuidados muito
especiais às crianças. Portanto, elas
também são beneficiadas.
Como foi a sua infância?
Eu sou de Alagados, aqui em
Salvador, aquela comunidade das
palafitas. Minha mãe, Maria José,
já falecida, trabalhou em casa de
família, e meu pai, Manoel, é
ferreiro e fazia peças para terreiro
de candomblé, pois ele é ogã. A
gente vivia com as dificuldades de
falta de saneamento e de
abastecimento de água e luz. Eu
brincava na maré e ao mesmo
tempo coletava mariscos. Depois
meu pai foi trabalhar na empresa
de transportes do município e
minha mãe também arrumou
outro emprego. Eles lutavam muito
para a gente ter uma vida melhor,
principalmente com saúde e
educação. Veio o aterro de
Alagados e a vida melhorou. Eu
estudei em escola pública. Depois
fiz geografia na Ufba e mestrado
em educação na Uneb.
Qual é a sua mensagem para as
meninas e meninos com uma vida
parecida com a sua quando criança?
Que estudem muito. Foi isso que
minha mãe ensinou. A educação é
o caminho que emancipa.
Também chamada de
Congo-Brazavile fica perto de
Camarões. Sua capital é
Brazzaville e o país tem cerca de
4 milhões de habitantes. A
língua oficial é o francês
República
do Congo
A capital é Luanda e tem pouco
mais de 16 milhões de habitantes.
É uma república, portanto seu
presidente é eleito pelo povo. A
língua oficial é o português, mas
predominam muitas línguas do
grupo chamado de "banto"
Angola
A capital do Benim é Porto Novo.
Ele fica na parte ocidental da África
próximo a Burkina Faso e Togo.
Sua língua oficial é o francês.
O país foi chamado no passado de
reino do Daomé. Tem pouco mais
de 10 milhões de habitantes
Benim
É uma república formada por 36
estados. A capital do país é Abuja.
A língua oficial é o inglês, mas
muitos povos falam ioruba, fulani
e outros idiomas. Várias etnias
desse hoje país vieram para a
Bahia. A Nigéria tem cerca de 173
milhões de habitantes.
Nigéria
Já foi chamada de Zaire e acrescentou
o democrática para diferenciá-la do
país vizinho, a República do Congo.
Sua capital é Kinshasa. A língua oficial
é o francês, mas há várias línguas
nacionais. Tem uma população de 63
milhões de habitantes.
República
Democrática
do Congo
Encontre no
mapa, com ajuda
das fichas, os
países africanos
Ila Garcia