Página 11 - Caderno Consci

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SALVADOR
QUINTA-FEIRA
20/11/2014
ESPECIAL
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ESTILO
CRIANÇAS FAZEM QUESTÃO DE MANTER CABELOS CRESPOS, ROUPAS
NA MODA BLACK E AQUECEM NOVOS NICHOS DE MERCADO
MEIRE OLIVEIRA
repórter
Elas e eles olham no espelho e
gostam do que veem. Enxergam a
cabeleira crespa como mais um
aspecto de sua beleza. São
meninas e meninos que já não
sofrem por não ter o “cabelo
lisinho”. E essa turma de gosto
renovado estimula novos nichos
de mercado.
No universo da estética infantil
tem crescido o número de
profissionais focados em um
público cada vez mais exigente.
Para ele existem sabonetes,
óleos corporais, xampus, cremes
para pentear, hidratantes, perfu-
mes e aromatizadores de ambie-
nte. E o melhor. Tudo feito com
material orgânico.
A criação de novos padrões
estéticos e a transformação da
ideia de beleza têmbeneficiado as
novas gerações desde as décadas
de 60 e 70, segundo a antro-
póloga Ângela Figueiredo.
“Ainda existe dificuldade, mas
hoje há outros modelos e padrões
estéticos. Os pais são mais cons-
cientes e reagem para não re-
produzir nos filhos o que eles
viveram e entendem que a beleza
é campo do discurso”, diz.
CRIATIVIDADE
A antropóloga diz que ainda não
se mudou tudo, pois os discursos
no campo da publicidade, das TVs
e revistas ainda mostram poucas
referências da estética negra.
Mas já tem gente antenada a
essa tendência. A farmacêutica
Mona Soares, por exemplo, criou a
linhaEwéCosmética, que trabalha,
de forma artesanal, substâncias
naturais e, por conta disso, pode
ser utilizada pelo público infantil.
“Uso óleo e manteiga vegetal
da Amazônia, óleos essenciais,
extratos de plantas, cera de
abelha”, enumera.
A farmacêutica conta que
começou elaborando produtos
para os adultos, mas logo eles
pediram versões mais suaves para
as crianças.
Mona acertou e acaba de lançar
mais um produto infantil: a
pomada cicatrizante Erê, que leva
mel e camomila na composição, e
o Óleo das Yás, que evita estrias e
a flacidez em que está grávida.
O serviço mais procurado do
centro de estética Magia Azeviche
– que também atua na linha de
produtos orgânicos e naturais – é
a Ori-hidratação.
“O melhor cuidado para o
cabelo crespo é a hidratação.
Cabelo é carinho. É necessário
acabar com essa ideia de re-
lacionar o desembaraçar do
cabelo crespo com dor”, contou a
empresária Paula Azeviche, dona
do centro, que também oferece
serviço de penteados, masso-
terapia para crianças e vende
acessórios.
Na moda, duas estilistas deram
um toque infantil às suas grifes,
em Salvador. “Comecei com
pedidos dos pais e mães que
vestem minhas criações e percebi
que o mercado só oferecia roupas
para crianças com estampas de
personagens de desenho ani-
mado e sem referências negras”,
conta Najara Black, idealizadora
da marca N’Black, criada há nove
anos.
Há três anos a Negrif – da
estilista Madá, que atua no ramo
há 14anos – realizaumdesfilepara
lançar a coleção infantil. As
crianças que atuamcomomodelos
são escolhidas por votação nas
redes sociais. “Eles querem vestir o
macacão saruel e outros peças da
coleçãoadulta. Então façoa versão
infantil com estampas mais pró-
ximas da realidade delas”.
ENZO GOMES
O pequeno Enzo Gomes
Venâncio de Santana, 7 anos,
costuma escolher a própria roupa.
Além do estilo que optou para sair
neste especial, não abre mão do boné,
óculos escuros e bermudão. “Ando de
skate, e é melhor usar roupas mais
folgadas”, contou. No entanto, quando o
assunto é o visual do cabelo, costuma ser
o espelho do pai, o almoxarife Erick
Venâncio Santana Santos, 27 anos.
“Quando eu era rasta, ele criou
cabelo também. Mas eu cortei e
ele quis fazer o mesmo”,
disse Erick Venâncio.
CARINA DIAS
“Eu sou uma rainha”,
diz Carina Dias, 2 anos,
ciente da sua beleza enquanto
mexe no cabelo black que adora
deixar solto. Sua mãe, a
relações-públicas Renata Dias, conta que o
exercício para fortalecer a autoestima da
filha é constante. “Minha mãe fazia isso
comigo e, portanto, sempre me vi bonita.
Então, deixo ela passar creme no cabelo,
sentir a textura, se olhar no espelho.
Busco referências em brinquedos,
personagens de desenhos, de
livros. E ela se reconhece nelas
e gosta muito da própria
imagem”, afirma.
CAIO AYRÁ
Cortar o cabelo é
assunto proibido por Caio
Ayrá Vieira Rodrigues, 4 anos.
Tesoura só para tirar as pontas. A
vontade é respeitada pela mãe, a
cantora e professora Rachel Vieira, 33
anos. Ele sempre foi cercado de
referenciais negros nas influências musicais
– principalmente música negra americana–
na leitura e no que vê na televisão. “No
meu tempo não era assim, não se falava
do racismo como hoje. Sempre reforço
o fato de ele ser lindo e estimulo
a valorização da nossa
cultura”, contou Rachel.