Página 174 - A&D_v23_n3_2011

Versão HTML básica

Desequilíbrios regionais, entraves ao desenvolvimento econômico e social do Nordeste e pesquisa tecnológica
658
Bahia anál. dados, Salvador, v. 23, n. 3, p.653-669, jul./set. 2013
Guimarães Neto (2005) ratifica que as raízes
dos desequilíbrios regionais estão na forma como
os complexos exportadores, situados em diferentes
espaços e com bases produtivas bastante distintas,
se desenvolveram.
Com isso, afirmar que as
desigualdades, ainda hoje existentes, resultaram
apenas da atuação “impiedosa e voraz” de São
Paulo em relação às demais regiões seria um equí-
voco, como também não se pode deixar de assina-
lar a importante influência do período cafeeiro para
a sua posterior ascensão industrial. No entanto, há
outros fatores que devem ser lembrados quando da
análise das disparidades regionais no Brasil e que,
quando desconsiderados, podem acarretar conclu-
sões distorcidas.
A QUESTÃO REGIONAL E OS CAMINHOS DE
SUPERAÇÃO DOS DESEQUILÍBRIOS
A análise da questão regional e a situação par-
ticular do Nordeste em um quadro de desequilíbrio
já tinham sido analisadas por Furtado (1964, 1974,
1998) e também por Oliveira (1975, 1977), em um
modelo de mudança de “economias regionais” que
se articulavam muito mais para fora do que para
dentro do espaço nacional. Eram ilhas econômicas
com dinâmicas próprias que se alteravam quando
tinha início a integração nacional, acelerada na dé-
cada de 50 do século passado. Para os autores, a
causa do atraso do Nordeste está na sua forma-
ção histórica mais recuada, na época colonial, e na
primeira metade do século XX, diante do esqueci-
mento do Nordeste em termos de políticas públicas
vis-à-vis as regiões Sudeste e Sul. Esta formação
histórica gerou uma elite conservadora, incapaz de
pensar corretamente a questão regional, e refratá-
ria a mudanças sociais e econômicas que viessem
a ameaçar o poder político. A presença do Estado
na região, seja na política de combate à seca ou
no fomento à produção de açúcar de álcool, re-
forçava a estrutura social e os privilégios. “Ou se
mexe nas estruturas, ou não se enfrenta a questão
nordestina”, pensavam estes autores, influencia-
dos pelo ideário da Comissão Econômica para a
América Latina (CEPAL), organização na qual Cel-
so Furtado trabalhou durante dez anos, assimilan-
do a vertente estruturalista, e onde teve, segundo
suas próprias palavras, em Furtado (1998), “a sua
escola de trabalho como economista”. Vale a pena
destacar que, ao lado da visão de que o atraso do
Nordeste era de natureza estrutural, ambos, Furta-
do (1964) e Oliveira (1977), não deixavam de enfa-
tizar as limitações em termos de dotação de uma
cultura plenamente capitalista na elite econômica
do Nordeste, a “lúmpen burguesia”, como definia
Oliveira. Cabe ainda destacar que ambos os auto-
res também tinham dúvida em relação ao potencial
do semiárido no sentido de este vir a se converter
em um espaço produtivo próspero, não tanto pela
presença do latifúndio, mas, sobretudo, pelas limi-
tações da natureza.
Sem que tivesse havido mudanças estruturais
na economia, como reforma agrária, reforma urba-
na, reforma tributária etc., e sem que o poder polí-
tico saísse das mãos da elite, o Nordeste mudava
durante as políticas econômicas e sociais do ciclo
autoritário da vida política brasileira, por meio da-
quilo que ficou conhecido como a “modernização
conservadora”. O próprio Celso Furtado, quando
regressou do exílio, se deu conta de que algo ha-
via mudado na região em decorrência de ingentes
investimentos realizados. Em depoimento dado no
Clube de Engenharia no Rio de Janeiro, em mea-
dos da década de 1970, ele disse:
Enquanto não se mexer na estrutura fundiária,
enquanto não se promover o acesso da popu-
lação ao conhecimento, não será equacionada
a tragédia regional. O investimento realizado é
apropriado pelas elites, não chega à popula-
ção. Pode-se até modernizar o Nordeste, mas
não se vai nunca inserir a população nordesti-
na na dinâmica socioeconômica do país (BA-
CELAR, 2001).
De fato, durante ciclo autoritário recente, 1964
a 1986, o Nordeste exibiu uma taxa de expansão