Página 165 - A&D_v23_n2_2011

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Elisabete Santos, Luiz Roberto Santos Moraes, RenataAlvarez Rossi
Bahia anál. dados, Salvador, v. 23, n. 2, p.437-459, abr./jun. 2013
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e complementaridade entre os instrumentos de Co-
mando & Controle (C&C) e Instrumentos Econô-
micos (IE). Este texto defende a tese contrária, ou
seja, de que o uso de IE materializa o princípio de
que “a água precisa pagar a
água” e subordina os instru-
mentos de C&C à lógica da
acumulação, aos interesses
econômicos hegemônicos.
Isso se traduz nas formas de
acesso aos serviços de saneamento básico, em es-
pecial ao abastecimento de água e ao esgotamento
sanitário, como também ao uso da água como insu-
mo produtivo. Busca-se responder, ao longo deste
texto, à seguinte questão: quais desafios políticos
estão postos ao processo de implementação da Lei
das Águas, que institui a água como direito e como
bem econômico? O artigo defende a tese de que o
principal desafio enfrentado pela referida lei consiste
no avanço da universalização e da democratização
do seu acesso, e que isso depende da construção
de instâncias de participação de segmentos so-
ciais que defendam interesses coletivos e difusos
e, consequentemente, priorizem a universalização
do acesso à água. Desse modo, é preciso construir
novas formas de regulação, distintas das instituídas
pelo modelo neoliberal nos anos 90, como também
novos mecanismos de participação, particularmente
em realidades como as do estado da Bahia e da
cidade de Salvador, de modo a tornar realidade a
universalização do direito à água.
A metodologia utilizada consistiu na análise de
dados e informações secundárias de documentos
oficiais, com especial destaque para os relatórios
de conjuntura das
á
guas (BRASIL, 2012), o Pacto
Nacional pela Gestão das Águas I e II (BRASIL,
2013a, 2013b), o Plano Nacional de Recursos Hí-
dricos: prioridades 2012-2015 (BRASIL, 2011), o
GEO Brasil: recursos hídricos (BRASIL, 2007), o
Plano Nacional de Recursos Hídricos (BRASIL,
2006), além de
Charting our water future: econo-
mic frameworks to inform decision-making
(ADDA-
MS et al., 2009),
The United Nations world water
development report 4: managing water under un-
certainty and risk
(WORLD WATER ASSESSMENT
PROGRAMME, 2012) e o trabalho O caminho das
águas de Salvador (SANTOS, 2010), que faz uma
caracterização da qualidade
das águas em Salvador. As
principais referências teó-
ricas são Joachim Hirsch,
Boaventura de Souza San-
tos, Esteban Castro, István
Mészáros, Erik Swyngedouw, José Luiz Fiori e
Francisco de Oliveira.
A
COMMODITIZATION
DAS ÁGUAS
As civilizações sempre se constituíram em torno
de algum corpo d´água e, historicamente, a fartura
ou a escassez de água tem sido associada à saúde
ou à doença; ao progresso ou ao atraso. Além da
dimensão propriamente ambiental, a água tem um
significado simbólico e, milenarmente, está presen-
te no imaginário de vários sistemas religiosos como
elemento de purificação. A quantidade de água
disponível no mundo tem diminuído e, progressi-
vamente, aumentado o consumo. A UNESCO, em
relatório intitulado
World Water Assessment Pro-
gramme
(WWAP), expressa a preocupação quanto
às incertezas e os riscos das mudanças climáticas
e em relação à disponibilidade de água, refere-se
aos “
external stressors on water resources, and
sources of uncertainty
”, como também em relação
à
quantidade usada e
à
demanda futura: “
how much
water are we using now? How efficiently are we us-
ing it? How much will we need 30 years from now?
Fifty years?
” (WORLD WATER ASSESSMENT
PROGRAMME, 2012, p. 45-79). Como o referido
documento observa, apesar de essas questões
serem aparentemente simples, as respostas não
o são. A demanda de água encontra-se concen-
trada na agricultura, na produção de energia, nos
usos industriais e no consumo humano. Ademais,
apesar dos avanços nos serviços de saneamento,
A demanda de água encontra-se
concentrada na agricultura, na
produção de energia, nos usos
industriais e no consumo humano