Página 139 - A&D_v23_n2_2011

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Élvia Fadul, Lindomar Pinto da Silva, Lucas Santos Cerqueira
Bahia anál. dados, Salvador, v. 23, n. 2, p.409-423, abr./jun. 2013
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técnicos de gestão, da negociação de conflitos e
da promoção dos usos múltiplos da água. Dentre
suas competências destacam-se: arbitrar os confli-
tos relacionados aos recursos hídricos naquela ba-
cia hidrográfica; aprovar os
planos de recursos hídricos;
acompanhar a execução do
plano e sugerir as providên-
cias necessárias para o cum-
primento de suas metas; es-
tabelecer os mecanismos de
cobrança pelo uso de recur-
sos hídricos, sugerir os valores a serem cobrados
e definir os investimentos a serem implementados
com a aplicação dos recursos da cobrança.
Enfim, os comitês de bacia hidrográfica deverão
articular os diversos agentes em caso de conflito,
aprovar o plano de recursos hídricos e a implanta-
ção da cobrança pelo uso da água.
De acordo com Kettelhut, Amore e Leeuwestein
(1998),
a implementação dos comitês de bacias hi-
drográficas implica modificações profundas
no âmbito cultural e administrativo do Estado
brasileiro. Os comitês marcam o início da rup-
tura com políticas desenvolvimentistas e am-
bientais pontuais e são peças fundamentais
para a garantia do sucesso da gestão susten-
tável dos recursos hídricos no Brasil (KETTE-
LHUT; AMORE; LEEUWESTEIN 1998, p. 5).
Essa constatação reforça a importância deste
estudo, não apenas do ponto de vista teórico que
lhe dá sustentação acadêmica, mas, sobretudo, do
ponto de vista dos seus resultados práticos, tanto
no que se refere ao entendimento desse novo mo-
delo, como também das possibilidades de aportar
subsídios que auxiliem o seu desenvolvimento.
Este modelo brasileiro de gestão foi inspirado
na experiência francesa de gestão de recursos
hídricos e de saneamento, considerada uma das
mais bem-sucedidas da Europa central (MACHA-
DO, 2003). A experiência francesa tem como base
a ampla participação dos usuários de água e, como
um dos instrumentos, a cobrança pelo uso do recur-
so, delegando aos comitês a responsabilidade pela
arrecadação e pela destinação da receita.
A gestão dos recursos hídricos no Brasil sem-
pre foi constituída de forma
fragmentada, com inúmeros
organismos, consórcios in-
termunicipais, associações
e órgãos governamentais.
A adoção deste modelo de
gerenciamento por bacias hi-
drográficas parece acompa-
nhar uma tendência mundial, mas também encontra
algumas explicações locais de ordem econômica,
política e social. Para Kettelhut, Amore e Leeuwes-
tein (1998, p. 1), “a existência de conflitos relaciona-
dos ao uso de recursos hídricos está na origem da
criação das primeiras unidades gestoras de bacias
hidrográficas”. Os autores esclarecem que foram as
pressões de entidades governamentais, organiza-
ções não governamentais e usuários que levaram
o Estado a definir uma política nacional de águas,
processo este que se estendeu por quase dez anos,
resultando na Lei nº 9433, de 08 de janeiro de 1997.
Já Abers e Jorge (2005, p. 18), procurando en-
tender os fatores que levaram o país a criar tantos
comitês de bacia sem a devida institucionalização
dos instrumentos de gestão que dessem suporte
econômico e político a esses organismos, consta-
tam que “a variedade de motivações e iniciativas de
criação de comitês é intrigante, pois, à primeira vis-
ta, sugere a inexistência de uma lógica sistemática
por trás da criação de quase 100 comitês de bacia
no Brasil”. Nessa variedade de motivações, as au-
toras destacam ainda a perspectiva da implantação
da cobrança pelo uso da água, a questão ideológica
ligada ao bem “água”, a possibilidade de melhor ar-
ticulação entre os atores envolvidos, o processo de
descentralização de políticas públicas desencade-
ado pela Constituição de 1988 e consolidado pela
reforma do Estado de 1995, o estímulo também daí
decorrente de criação de instâncias e fóruns de
participação da sociedade. Ou seja, a existência de
Os comitês de bacia hidrográfica
deverão articular os diversos
agentes em caso de conflito,
aprovar o plano de recursos
hídricos e a implantação da
cobrança pelo uso da água