Página 202 - A&D_v23_n2_2011

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Interface entre desertificação e mudança do clima e os efeitos sobre a gestão de recursos hídricos:
levantamento bibliográfico e abordagem conceitual
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Bahia anál. dados, Salvador, v. 23, n. 2, p.475-486, abr./jun. 2013
OBJETIVO
Este artigo tem como objetivos realizar um le-
vantamento bibliográfico referente aos temas mu-
dança do clima e desertificação e verificar a arti-
culação e os campos de intersecção desses temas
com a gestão dos recursos hídricos no semiárido
brasileiro.
Pretende-se como isso ampliar o nível de co-
nhecimento acerca dos efeitos da mudança do cli-
ma e da desertificação sobre os recursos hídricos,
identificar lacunas e necessidades de estudos, bem
como indicar diretrizes para a gestão de recursos
hídricos que possam aumentar a resiliência e re-
duzir a vulnerabilidade do semiárido brasileiro aos
efeitos da mudança do clima e da desertificação.
DESERTIFICAÇÃO – CAUSAS E EFEITOS
De acordo com a Organização das Nações Uni-
das (2011), desertificação é a degradação da terra
nas zonas áridas, semiáridas e subúmidas secas,
resultante de vários fatores, incluindo as variações
climáticas e as atividades humanas. Por combate à
desertificação entendem-se as atividades que fa-
zem parte do aproveitamento integrado da terra nas
zonas áridas, semiáridas e subúmidas secas, com
vistas ao seu desenvolvimento sustentável, e que
têm por objetivo:
a prevenção ou a redução da degradação das
terras;
a reabilitação de terras parcialmente degrada-
das; e
a recuperação de terras degradadas.
Associada à degradação da terra nas zonas
áridas, semiáridas e subúmidas secas, está a de-
gradação dos recursos hídricos. Os processos de-
sencadeantes da desertificação, com o devido tem-
po de persistência, resultam em escassez hídrica,
decorrente de desequilíbrios entre oferta e deman-
da, e em perda de solo, resultado do comprometi-
mento de estrutura e da perda de matéria orgânica,
reduzindo, assim, sua capacidade de infiltração e
retenção de umidade. Os corpos de água doce são
afetados pela menor infiltração e menor recarga de
água subterrânea que, por sua vez, darão menor
suporte à vegetação natural que promove a pro-
teção da camada superficial do solo, reforçando o
ciclo de degradação e prejudicando a capacidade
de o sistema se reestabelecer ante um fato pertur-
bador de seu equilíbrio.
As zonas áridas, semiáridas e subúmidas se-
cas têm suprimento de água doce limitado, com
possibilidade de grande variação de chuvas ao
longo do ano. Adicionalmente à variabilidade
interanual, grandes variações ocorrem durante
anos e décadas, frequentemente caminhando
para uma seca. Não raramente associa-se seca
à degradação de terras, entretanto, seca é um
fenômeno natural
1
que ocorre quando são verifi-
cados valores de precipitação abaixo do normal,
perdurando por um longo período de tempo, com
abrangência regional.
Segundo a Organização das Nações Unidas
(2012), o processo de desertificação envolve a per-
da da produtividade, biológica e econômica, em
plantações, pastagens e vegetação natural. Deve-
-se principalmente à variabilidade climática e à fal-
ta de sustentabilidade nas atividades humanas. As
formas mais comuns de uso insustentável da terra
são pastejo e cultivo excessivos e práticas equivo-
cadas na agricultura irrigada.
No Cartograma 1 é possível observar a relação
entre seca e perda de produtividade primária líqui-
da, que é o montante líquido de carbono fixado pela
vegetação por meio da fotossíntese durante o ano.
Estima-se que aproximadamente 2% da produtivi-
dade primária líquida é perdida anualmente devido
à degradação das terras secas (regiões áridas, se-
miáridas e subúmidas secas).
1
UNCCD, art. 1º, letra “c”: “Por “seca” entende-se o fenômeno que ocorre natural-
mente quando a precipitação registrada é significativamente inferior aos valores
normais, provocando um sério desequilíbrio hídrico que afeta negativamente os
sistemas de produção dependentes dos recursos da terra” (ORGANIZAÇÃO DAS
NAÇÕES UNIDAS, 1992a).